avião lotado. sentei ao lado de um cara com aparência nada amigável, do tipo que faz questão de não olhar pra lado algum durante a viagem, pra não criar a ilusão de que ele se interessa por algo que não ele. foda-se, aquilo não me fez diferença alguma. esperei pra ver quem iria me sufocar do lado esquerdo e, surpreendentemente, até esbocei um sorriso quando vi uma garota tirando a mochila das costas e aprontando-se pra se sentar ao meu lado. ela sentou, abriu a mesinha, colocou sua coca zero e abriu um pacote de onde tirou algo que, de canto de olho, tive a impressão de ser um pão de queijo. após outro pão de queijo e um sanduíche, o qual ela mordia vorazmente, deixando pequenas migalhas no canto da boca, o cheiro da comilança começou a me afetar. aposto que ela não aceitaria de forma alguma que eu peidasse ao lado dela, mas não via problemas em dividir o aroma daquela refeição comigo. enfim, não restou nada a não ser ouvir música e ler. abri um livro que, dentre outras coisas, fala sobre cigarro. como fumante que sou, senti uma puta vontade de fumar. perguntei a mim mesmo "por que raios eu não posso fumar aqui dentro". sem uma resposta realmente plausível, só pude mandar à merda o filha da puta que começou com essa história de que cigarro faz mal. pousei em são paulo e a primeira coisa que fiz foi procurar uma lojinha pra comprar um maço. óbvio que não encontrei nada aberto. afinal, era véspera de natal e todos adoram estar com a família nesse dia. óbvio, também, que ninguém liga pra isso no resto do ano. entrei no táxi e parti pra casa de minha mãe. perto do ibirapuera, enfrentei um trânsito considerável de carros e pessoas admirando a árvore natalina montada perto do monumento às bandeiras. "ridículo", pensei comigo. foi nesse momento que vi que não me sentia bem em são paulo. cheguei em casa, deixei minha mala na portaria e fui atrás de algum comércio aberto pra comprar cigarros. encontrei um boteco de esquina e, ao atravessar a joaquim eugênio para alcançá-lo, um mendigo elogiou minha camiseta. como tenho duas iguais, pensei que deveria buscá-la em casa e dar a ele. não o fiz, mesmo sabendo que aquele seria o único ato de carinho que receberia nessa cidade. passei os dois últimos dias imaginando as pessoas que gostaria de rever, aquelas com quem gostaria de sentar e ouvir as novidades, aquelas com quem passaria a noite bebendo chopp, aquela que eu sei que não vou ver, a mesma que sei que já tem com quem sair e também imaginei a desculpa que todos me dariam pra não fazer nada disso. fico puto por não poder fumar na casa de minha mãe. não exatamente por ela proibir, mas porque não consigo ficar bem humorado por muito tempo sem fumar. é foda não saber mais com quem posso sair aqui, como faço pra ir em algum lugar sem meu carro (que está onde hoje é minha casa), como faço pra não pensar na pessoa que deveria passar as noites comigo, como faço pra não me sentir mal e com saudades de onde tenho tirado os bons momentos de minha vida hoje em dia. deixei amigos aqui e hoje eles seguem sua vida e não devem se ver na obrigação de parar tudo para me ver. penso que, se demorar muito aqui, talvez eu volte pra lá e os amigos que fiz e que me fazem tão bem hoje também estejam seguido em frente e não mais tenham como parar tudo pra dividir algo comigo. sei que há uma diferença, pois quando sai já sabia bem que estava num caminho bem diferente daqueles que considero amigos em são paulo. sei bem que sai daqui porque não me sentia mais confortável. porém, imaginei que fosse ser diferente, que quando voltasse, mesmo que em visita, sentiria um ânimo renovado. não. só tenho pisado aqui pra saber porque fui embora. deixei sentimentos aqui que ardem como pimenta no cu, ferem como soco no queixo. não sei bem se fugi ou parti daqui. sei somente que não estou aqui há tempos.
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Um comentário:
Oie, li.
Sentimentalismo natalino.
Isso passa.
Onde vamos almoçar segundaaa?
Eu queria ir lá na salada, mas demora...
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